top of page

Leonardo tem 19 anos e faz o 3o período de Engenharia Civil na UFAM. Apesar de estudar a aréa de exatas, ele dedica seu tempo a coisas que vão além do cálculo. O futuro Engenheiro escreve por hobby, mas espera um dia escrever um bom livro.

 

Contato: https://www.facebook.com/leonardo.brocki?fref=ts
 

 

 
 
Leia abaixo o texto de Leonardo Brocki.

Leonardo Brocki

PESADELO POLÍTICO
 

      Acordou às quatro e meia da manhã, como é de praxe, o horário estava tão fixado em sua rotina que nem necessitava mais colocar o radinho para despertar. Olhou um pouco para o teto, deu um longo suspiro, um leve beijo em sua mulher ainda adormecida, levantou.

 

       Banhou-se, vestiu-se e partiu. Tudo silenciosamente. Perguntou-se se os filhos sentiriam sua ausência em suas vidas, ou se, como nunca o tiveram muito presente, nem notariam. A casa era mais um lugar para dormir do que um lar, passava 16 horas de seu dia na rua e de 5 a 6 na cama.

 

      Foi para a parada de ônibus, já eram 5 horas, devia estar chegando logo. O veículo chegou e, mesmo neste horário, lotado.  Saía cedo todos os dias, pegava o coletivo todos os dias, resmungava em pensamento sobre ter que aguentar dividir meio metro de chão com outras três pessoas naquele veículo instável, ao menos não corria o risco de cair, brincava consigo mesmo.

 

       Chegou na obra às cinco e meia, a vantagem de sair cedo era não ter que encarar o trânsito infernal da cidade em horário de pico, regalia que não teria na volta, às seis horas da tarde. O café da manhã já estava pronto. Serviu-se de pão e muito café, seria um longo dia, como todos são. Vestiu o equipamento de proteção, botas, capacete, luvas e foi realizar o seu trabalho com mais cento e noventa e oito colegas. “Éramos duzentos”, refletiu, lembrando-se do colega de trabalho e bom amigo que perderam na semana passada quando um bloco de madeira caiu em sua cabeça, estilhaçando o capacete. O homem saiu aparentemente ileso, apenas para não acordar na manhã do dia seguinte. Hemorragia interna, foi o veredicto. O colega morava no mesmo bairro de casas de palafita que beiravam o igarapé imundo e poluído.

 

       Trabalhou, trabalhou, trabalhou, deu uma pausa para beber água, trabalhou, trabalhou, pausa para o almoço, trabalhou, trabalhou, pausa para ir para casa. As horas passaram como minutos.

Enquanto saía do campo de obra, observou as propagandas políticas penduradas por todo canto nas ruas. Não agüentava mais as cantigas, as brigas, as falácias, as encenações. “A cidade vira um verdadeiro palco em época de eleição, mas vem político, vai político e o ônibus que pego continua lotado, o trânsito continua parado, as escolas sem professores. Meu salário aumenta tão pouco que poderia jurar que, mesmo aumentando, posso comprar cada vez menos comida lá pra casa”.

 

       Chegou em casa às oito da noite, o nariz demorava um dez minutos para acostumar-se ao fedor característico do igarapé. Perguntou como foi a escola aos três garotos. Sempre obtém a mesma resposta, pelo menos nenhum deles tirou nota vermelha. Jantou, assistiu ao jornal, ao horário político e antes que percebesse, adormeceu.

Acordou em seu quarto, mesmo sendo um único cômodo da casa/mansão de dois andares ainda era maior que o casebre em que dormiu. A esposa já havia levantado, ligou a televisão, estava passando jornal. A bonita repórter alertava sobre o grande índice de mortalidade no setor de construção civil, partindo para a cotação dos votos do dia anterior.

 

        Havia sido reeleito, agora era só pagar os favores e lucrar, esqueceu-se do sonho.

Escreve textos, livros, resenhas, expressa sua opinião por palavras? Mande seu conteúdo para nós! Clique em Contato

Toda Quarta-feira seu texto no Cartaz Branco

Revisado por: Ayla Viana

bottom of page